HOMENAGEM AO ARQUITETO RIBEIRO TELES, NA CASA DO OESTE


“O Mandato do Homem é a obrigação, perante um ser superior, de ordenar o seu território com vista a formar o Paraíso”















Estas palavras podem resumir o que nos foi dito na tarde do passado dia 9 Novembro, em que acolhemos com imenso prazer e orgulho o Sr. Arquiteto Gonçalo Ribeiro Telles, na Casa do Oeste, para lhe prestarmos uma justa homenagem em nome da Fundação João XXIII-Casa do Oeste e dos Movimentos Rurais da Ação Católica (JARC e ACR).
Em boa hora aceitou o convite que lhe foi endereçado depois de termos lido com agrado as palavras que proferiu ao Jornal Expresso em 20 de Abril, respondendo à pergunta “A sua vida foi também política. De onde lhe vem o lado cívico?”

“Está ligado à Juventude Agrária Católica e à relação direta com os agricultores do oeste. Na zona de Mafra e das Caldas da Rainha tinham nas mãos uma paisagem fundamental. Para terem agricultura, com o mar ali ao lado e os ventos salgados, faziam a agricultura dos canaviais com canas secas entrelaçadas. Vi naquele miolo extraordinário a obra do homem pela defesa da terra. Estes pescadores, quando saíam do mar eram hortelões nas areias. Com eles aprendi o que está por baixo de tudo. O meu caminho da militância cívica e da política começou aí.”

Tendo em atenção a sua avançada idade, de mais de noventa anos, optámos por  um programa calmo e uma plateia reduzida de duas dezenas de pessoas convidadas: membros dos órgãos socias da Fundação, da equipa diocesana da ACR, autarcas da Câmara Municipal e da Junta de Freguesia de Ribamar,  representantes  da ADL da Lourinhã, de Associações ambientais: Lourambi, Geota, Pato, elementos da comunicação social, alguns agentes de desenvolvimento, técnicos de planeamento, agricultores (de produção tradicional e biológica), técnicos agrícolas e dirigentes associativos…que ouviram e partilharam as suas questões com o homenageado.

Depois de uma manhã em que percorreu o litoral (desde a Ericeira) e a paisagem do Oeste até chegar a Ribamar, ficou a conhecer a Casa do Oeste, antes de um almoço entre os convidados.
A justa homenagem foi explicada e enquadrada pelo Pe Batalha a que se seguiu um espaço de colóquio com a sempre oportuna e esclarecida moderação do Dr Acácio Catarino.

A conversa correu livre, dentro do registo algo irreverente, “utópico” e provocatório que lhe é reconhecido.
Começou por lembrar as palavras do poeta militar de 1600, D. Francisco Manuel de Melo que já referia  “uma floresta de enganos”, para numa alegoria comparar com os tempos que correm onde os termos e as nomenclaturas são motivo de enganos, são mal usadas e de uma forma abusiva, servindo para legitimar conceitos que se defendem.
“O que é uma floresta? Perguntou. Usa-se o termo para legitimar, vender madeira! Uma floresta é um eucaliptal? um pinhal? um montado? uma monocultura?”
Ou num outro exemplo:
“O que é ambiente? Um espaço artificial criado num terceiro andar de um prédio? Dar resposta ao artificialismo?
“Legitima-se e legitimou-se o progresso fazendo edifícios e esquecendo a ruralidade” e mais adiante acrescenta “ Há uma ideia de progresso para fazer crescer riqueza” mas está-se borrifando para de onde vem e para onde vai… o tempo e o espaço são esquecidos…”

O pai da REN e da RAN (Reserva Agrícola  Nacional e Reserva Ecológica Nacional),
lamentou a falta de compreensão desses documentos enquadradores de ordenamento que muitas vezes se aplicam de forma inflexível… foi defendendo que eles servem o homem… e a natureza é do homem, pelo que devem ser entendidos neste sentido, lamentando que isso não tenha ocorrido.

Lamentou que “o progresso tenha estado na edificabilidade de edifícios e das vias de circulação que os envolvem  e isso destruiu o país”

Lamentou o paradigma apregoado de uma sociedade assente num sector terciário e secundário e num reduzido sector primário que, agora, se procura inverter mas que deixa um rasto de destruição ao longo dos tempos: industria desmedida, sistema capitalista desmesurado, guerras e conflitos do homem pela terra e pelos espaços…

Referiu a trindade onde deve assentar a agricultura: AGER / SALTUS/ SILVA
(conceitos que vêm dos romanos): campo de culturas arvenses, cultivadas, campo abandonado que serve de pasto e silva, isto é, floresta...

Alertou para a globalização que conduz a uma uniformização de interesses e da natureza humana, para uma humanidade sem diversidade.
Depois de uma interessante reflexão provocatória foi aberto o dialogo e uma plateia interessada e conhecedora questionou o  vencedor, em 2103, do prestigiado prémio Sir Geoffrey Jellicoe, a mais importante distinção internacional de arquitetura paisagista.

Questionado sobre a aplicabilidade dos instrumentos de gestão do território, sobre a agricultura biológica, a valorização do consumo de proximidade, o reconhecimento de produtos e culturas especificas, sobre o paradigma da União Europeia, o valor das entidades locais de desenvolvimento, a tudo respondeu com o saber acumulado assente em premissas e postulados que toda a vida defendeu e praticou e foi lembrando:  
“Dignificar a ruralidade em todos os seus termos, e não só nos mercados”; “A gestão do espaço, é para servir o Homem!”.

No final, depois de um sonoro e prolongado aplauso, o Município da Lourinha e a ADL (Associação de Desenvolvimento da Lourinhã), num gesto de homenagem, agraciaram o sr Arquiteto com a oferta de edições locais e o Padre Batalha encerrou a sessão oferecendo, em nome dos Movimentos Rurais da Acção Católica e da Fundação, uma medalha da Casa do Oeste e um livro, “Solidariedade com a Guiné”, com uma dedicatória  na qual se expressa o “apreço e gratidão pela persistente luta cívica ao serviço do desenvolvimento sustentável e pelo equilíbrio entre o mundo rural e urbano”. Exemplo que é para nós um estímulo e se funda nos mesmos princípios que nos regem. 

David Gamboa